Tragédia de Brumadinho: ‘Pais e mães estão morrendo sem ver a justiça ser feita’, dizem atingidos
Retirada do nome do ex-presidente da Vale do processo criminal é uma das revoltadas dos familiares das vítimas

Publicado em 25 de janeiro de 2025
Por Gabriel Rezende e José Vítor Camilo
Via: O Tempo
“De repente, não tem mais nada, só uma tristeza total, um vazio, uma ausência. Não sou uma profunda conhecedora do dicionário ou dos sentimentos, mas não tenho palavras para descrever o que senti. Tristeza é pouco, desespero é pouco, raiva é pouco”. A fala é de Helena Taliberti, de 67 anos, que, no dia 25 de janeiro de 2019, perdeu em poucos segundos o que tinha de mais precioso em sua vida.
O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, arrancou dela os dois únicos filhos e a nora, grávida de cinco meses de seu primeiro neto, que ela enterrou antes mesmo de conhecer. A dor dessa mãe é compartilhada com as famílias das 272 pessoas mortas no rompimento, que, passados seis anos, seguem aguardando pelo que chamam de “reparação das vidas”, que, para eles, só virá com a responsabilização criminal dos responsáveis pelo crime.
Helena Taliberti perdeu os dois filhos, Camila e Luiz, que estavam hospedados em uma pousada – Foto: Arquivo Pessoal
Sem nenhuma nova decisão desde setembro na Justiça Federal, o processo criminal segue sem previsão de conclusão. Em março de 2024, menos de dois meses após o “aniversário” de 5 anos da tragédia, os familiares das vítimas ganharam, de “presente” dos desembargadores da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), um habeas corpus que suspendeu as ações criminais contra o ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, à frente da empresa na época que a barragem se rompeu.
“A gente entende que o processo criminal precisa ser criterioso, para que, quando chegar ao julgamento, não volte. Mas queríamos muito um caminhar mais célere. Esse crime que aconteceu em 2019 continua acontecendo, já que vários pais e mães já morreram sem ver a Justiça ser feita. Isso (punição dos culpados) é de suma importância não só para nós, familiares das vítimas, mas para o Brasil ser visto de outra forma lá fora. A gente acredita que, se não houver punição adequada para as pessoas que cometeram o crime, vai acontecer novamente. A Vale sabe que, com o poderio financeiro dela, consegue manipular o processo, como está conseguindo até aqui”, desabafa Maria Regina da Silva, 60, mãe de Priscila Elen da Silva e integrante do conselho fiscal da Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem em Brumadinho (Avabrum).
Assim como Maria Regina, a moradora de São Paulo Helena Taliberti, que perdeu os filhos Camila e Luiz no rompimento, também atribui à falta de punição dos responsáveis o principal motivo de indignação após seis anos do crime “Eu acredito na Justiça brasileira, pois eu acho que ela é a única forma do meu luto ser minimamente apaziguado. Eu perdi a minha família toda e sei que podia ter sido evitado. A minha casa ficou sem ninguém, silenciosa. Tem dias, até hoje, que eu penso que uma hora eles vão entrar pela porta, dizer que estavam sem bateria no celular, sem internet. Não me parece possível alguém perder a família toda”, desabafa.
Economista de formação, Helena conta que sua visão sobre as grandes corporações mudou completamente após o trauma que sofreu. “Acho que, se você é responsável por grandes empresas, é preciso existir uma ética em que a vida está acima de qualquer coisa, a vida das pessoas, das cidades, dos seus funcionários, do meio ambiente. E eu percebi ali que isso é absolutamente ignorado. É o lucro acima de qualquer coisa, as vidas humanas não têm o menor valor. Isso ainda me choca muito, pois não precisava ser assim, podia ter sido evitado”, diz.
“Veja quanta coisa a empresa teve que fazer para tentar, minimamente, recuperar uma milésima parte do tamanho da tragédia que causou. Não vão reparar tudo nunca, tem coisas que não se repara, não tem como trazer meus filhos de volta. Por isso a Justiça ser feita é a única forma do meu luto ser apaziguado”, finaliza Helena.
Advogado da Avabrum no processo criminal e membro do Instituto Cordilheira, Danilo Chammas também critica a impunidade contra os responsáveis pelo rompimento. “Brumadinho é um símbolo do que acontece quando a ganância supera a responsabilidade. Seis anos depois, a justiça ainda é uma promessa, não uma realidade”, afirma. Ele ainda cita a multa de R$ 27 milhões aplicada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) contra Peter Poppinga, ex-diretor executivo da Vale, como um passo importante. “É um avanço, mas não resolve o problema. Precisamos de decisões que tragam consequências reais, tanto no âmbito penal quanto em mudanças estruturais que impeçam novas tragédias. Brumadinho ainda clama por Justiça”, reforça o defensor das famílias das vítimas.
MPF recorreu contra remoção de ex-presidente da lista de réus
Após a decisão da 2ª Turma do TRF-6, em novembro de 2024 o Ministério Público Federal (MPF) apresentou um recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o acórdão que determinou o trancamento da ação penal contra o ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman. Procurado novamente em janeiro de 2025, o órgão de justiça Federal informou apenas que a ação criminal corre em segredo de Justiça e que, por este motivo, não poderia repassar informações adicionais. “O que podemos reiterar é que o MPF está fazendo o possível para que o caso tenha julgamento célere”, escreveu o MPF.
Por outro lado, procurada por O TEMPO, a juíza federal Raquel Vasconcelos Alves de Lima, responsável pela ação criminal, que tem 15 pessoas e duas empresas como rés, justificou a “demora” informando que as ações penais estiveram suspensas entre 12 de abril e 6 de setembro de 2024 por decisão do Ministro Sebastião Reis Júnior, do STJ, proferida durante análise do habeas corpus concedido ao ex-presidente da companhia.
“Em 09 de setembro de 2024, retomou-se a contagem do prazo para apresentação de resposta escrita à acusação. A maioria dos denunciados já apresentou suas defesas, faltando algumas poucas respostas à acusação a ser apresentadas, cujos prazos ainda não se encerraram. O passo seguinte será a análise das defesas apresentadas e designação de audiências de instrução e julgamento, que ainda não têm data marcada para acontecer”, concluiu a magistrada federal Raquel Vasconcelos.
A defesa de Fábio Schvartsman foi procurada por O TEMPO, mas até a publicação da reportagem ainda não tinha se manifestado.
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